POEMA DO ETERNO RETORNO
Se não houvesse mais nada
(mesmo mais nada)
senão átomos,
se a mesma causa desse sempre o mesmo efeito
e para cada efeito houvesse sempre a mesma causa
então o meu salgueiro
havia um dia de ressuscitar.
Se não houvesse mais nada
(mesmo mais nada)
senão átomos,
e eu próprio,
na efeméride eternamente repetida
deste momento de agora,
tornaria a rever o meu salgueriro.
Se não houvesse mais nada
(mesmo mais nada)
senão átomos,
os milhões de milhões de milhões de átomos
que compõem os milhões de milhões de milhões de galáxias
dispostos de milhões de milhões de milhões de maneiras diferentes,
teriam forçosamente de repetir,
daqui a milhões de milhões de milhões de séculos,
exactíssimamente a mesma disposição que agora têm
E então,
nesse dia infinitamente longínquo mas infinitamente próximo,
eu, fulano de tal,
filho legítimo de Fulano de tal e de Dona Fulana de Tal,
nascido e baptizado na freguesia de Tal,
a tantos de Tal,
neto paterno de Fulanos de Tal,
e materno de Tal e Tal,
etc. e tal,
se não houvesse mais nada
(mesmo mais nada)
senão átomos,
encontrar-me-ia no mesmo ponto do mesmo Universo
a olhar parvamente para o meu salgueiro.
Isto, é claro,
se não houvesse mais nada
(mesmo mais nada)
Senão átomos.
António Gedeão