Perder o norte
Já uma vez aqui chamei à Maconde a "nossa Zara". Talvez fosse mais correcto dizer a Zara que não chegamos a ter. A génese pode explicar uma boa parte das diferenças entre os dois projectos. A Zara foi o resultado da iniciativa e da visão de Amâncio Ortega. Que começou com um pronto a vestir na Corunha e hoje lidera um dos maiores grupos mundiais do sector.
Já uma vez aqui chamei à Maconde a "nossa Zara". Talvez fosse mais correcto dizer a Zara que não chegamos a ter. A génese pode explicar uma boa parte das diferenças entre os dois projectos. A Zara foi o resultado da iniciativa e da visão de Amâncio Ortega. Que começou com um pronto a vestir na Corunha e hoje lidera um dos maiores grupos mundiais do sector.
A Maconde nasceu de um projecto de investimento estrangeiro do grupo holandês Macintosh que se instalou em Vila do Conde, em 1969, a produzir calças de homem.
Houve um momento em que o percurso das duas empresas se cruzou. Em 1988, a Zara dava o primeiro passo na sua estratégia de internacionalização com a abertura de uma loja no Porto. É também por essa época que a Maconde deixa para trás a marca Superconfex, associada à imagem de roupa barata e sem estilo, e cria a Macmoda, com um posicionamento de mercado muito próximo da concorrente espanhola.
Em 1993, os holandeses anunciam a intenção de abandonar Portugal e um grupo de quadros da empresa, liderados por Joaquim Cardoso, concretizam o maior MBO realizado à época em Portugal (13,5 milhões de euros).
Mas enquanto a Zara prosseguia o seu caminho, com uma estratégia de inovação e de antecipação da moda, que se tornou um "case study", a Maconde falhou sucessivas apostas para complementar a sua vocação inicial de fabricante de fatos de homem com o desenvolvimento da actividade de retalho, que lhe permitiria capturar mais valor acrescentado.
Os paralelismos acabam aqui. Com a primeira internacionalização mal encaminhada, a Macmoda fecha as portas em Espanha. O golpe de misericórdia é o afastamento de Joaquim Cardoso, que no final de um processo de divergências crescentes com os seus parceiros de negócio, acaba por lhes vender os seus 60%. Foi no início desta década e desde então foi sempre a descer.
A reestruturação dos últimos anos foi dura. Sob a liderança de Mário Pais de Sousa, reduziu drasticamente as operações industriais (vendeu e encerrou fábricas, cortou mais de mil postos de trabalho) e alienou as marcas comerciais Macmoda e Tribo. Pais de Sousa recentrou o grupo na área industrial mas deixou-o antes de concluir o trabalho, sem ter conseguido fechar o acordo de reestruturação financeira com a banca e em rota de colisão com os principais accionistas.
A Maconde transformou-se numa fritadeira de gestores. Depois de Pais de Sousa, que saiu no início do ano, ainda por lá andou Maria Cândida Morais.
É neste contexto que um ministro, Manuel Pinho, e um secretário de Estado, Castro Guerra, aparecem a promover um acordo entre a empresa e a banca, que além da reestruturação financeira que já estava negociada, contempla a entrada de sete milhões de euros de dinheiro fresco para financiar a actividade corrente e, ao que tudo indica, a saída de alguns dos sócios do primeiro MBO e a entrada de gestores no capital, com o apoio das capitais de risco do Estado.
Percebe-se a preocupação do Governo com a situação de crise da região Norte, a mais atingida pelo processo de ajustamento à globalização. A Maconde ainda emprega perto de 600 trabalhadores e tem impacto na região.
O Norte está a passar por uma crise que não fica muito a dever à crise da região de Setúbal nos anos 80 e 90.
É natural que o Governo se preocupe com isso. Mas não é com intervenções casuísticas nas empresas e pressões sobre os bancos que o problema se resolve. Pelo contrário, são balões de oxigénio e sinais errados para o mercado.
Mas parece que o desnorte já começou.
Luísa Bessa (17-09-2007)
JN